Hartley nasceu em Berkeley, Califórnia, em 1959. Filha de pai luterano e de mãe judia, é a caçula de quatro filhos. Seus pais se converteram ao budismo quando ela era adolescente. Depois do colegial, começou a estudar enfermagem. Em 1982, durante seu segundo ano na escola de enfermagem, ela começou a trabalhar como stripper em San Francisco. Começou a atuar em filmes pornográficos em 1984. Formou-se em enfermagem em 85, e trabalha até hoje na indústria pornô.
Ela considera a si mesma como uma bissexual, feminista e exibicionista. Afirma que entrou neste negócio para expressar suas próprias idéias a respeito de sexo e ajudar as mulheres a se libertarem de seus medos e a descobrirem uma nova maneira de encarar o prazer sexual.
Inteligente e articulada, sempre atuou como porta voz e defensora do mercado pornô, com forte presença na mídia. Escolhi resenhar a Nina porque tenho um respeito fortíssimo pela inteligência dela. Coloco a seguir um trecho de uma entrevista sua:
"As mulheres sempre foram usadas para colocar outras mulheres na linha. E aqui na América há algo chamado de "vergonha vadia", quando as mulheres normais usam os termos "vagabunda" ou "puta" para constranger as outras mulheres e corrigir o seu comportamento. Assim, "vagabunda" é alguém que você não aprova o sexo. Ou o tipo de sexo que eles não aprovam, ou a quantidade de sexo que você não aprova. A idéia é que se o seu comportamento sexual me incomoda, em vez de assumir a responsabilidade por meus sentimentos, vou atacar e tentar pará-lo.
Sexo e sexualidade afetam a todos. Todo mundo precisa de contato humano. Os seres humanos são criaturas sociais. Precisamos tocar. Precisamos de contato. E muitas pessoas sofrem por causa da cultura. Não importa se a sua cultura ou a minha cultura. Nenhuma cultura é realmente positiva com o sexo. Cada cultura tem seus problemas com o sexo. Algumas têm mais problemas do que outras. A religião trava uma guerra de milhares de anos contra o corpo e contra o prazer, como se sentir-se bem fosse algo diabólico e repulsivo a Deus.
A realidade é que você se sente bem fazendo o sexo que te apetece e eu me sinto bem com a vida sexual que quero, e ambos podemos ser felizes com as nossas vidas. Mas o código não permite isso, porque como disse alguém: "A virtude das mulheres é a melhor invenção do homem".
E assim como toda moeda tem dois lados, você não pode criar o mito da virgem sem criar também o mito da puta. Porque na nossa cultura só precisa de um pequeno deslize para que uma virgem se converta numa puta. Um erro e é uma cadela, é uma vergonha, é expulsa do clube das boas meninas.
E quando uma mulher é expulsa do clube das boas meninas, podemos agredi-la. Podemos prendê-la, atacá-la, levar seus filhos .... Podemos obter favores sexuais dela"
Fragmento da entrevista com Nina Hartley publicada em junho de 2010 na revista “Rock´n´Roll Popular Magazine”
Praqueles que se interessaram por ela, entrem em seu site, é bem interessante:
E pra quem tiver aí torcendo o nariz por eu ter resenhado uma mina do pornô, coloco a seguir dois trechos de estudos sobre pornografia que acredito ser pertinentes.
“Desde seu início, a mulher é mostrada no universo pornô nestes dois registros analisados: submissa ao desejo masculino e ao mesmo tempo portadora de uma sexualidade voraz e insana. Como um instrumento para a satisfação do homem, o corpo feminino apresenta-se sempre disposto ao coito, pronto para as práticas mais inacreditáveis que visam, antes de tudo, a excitação do público masculino. (...) Ainda assim, existe uma linha mais alternativa de pornografia, incluindo aí os filmes de temática sadomasoquista/fetichista/bizarros, de produtoras pequenas e independentes, que tendem a fugir deste padrão que utiliza o corpo da mulher apenas como instrumento do gozo masculino. Vários destes filmes apresentam mulheres no comando da produção e direção, além de trabalharem como atrizes principais. O prazer é mostrado tendo como ponto de referência a mulher, e muitas vezes os homens estão em cena apenas para compartilhar o gozo feminino. Este tipo de produção mostra claramente que na pornografia tanto o corpo masculino quanto o feminino são meios para o gozo do outro, especialmente do espectador”
Jorge Leite Jr, Das Maravilhas e Prodígios Sexuais, Annablume, 2006.
“Uma visão patriarcal a respeito da utilização da pornografia hard core pode estar em discussão, mas nos pornovídeos essa questão me parece, hoje, secundária. A busca do prazer (sexual) e de satisfação do desejo faz parte das necessidades de ambos os sexos, e de certo modo a mulher/personagem feminino parece ter, hoje, uma representação mais ‘atualizada’ de seus anseios. Os pornovídeos talvez mais liberem do que objetifiquem a mulher”
Nuno César Abreu, O Olhar Pornô, Mercado das Letras, 1996.