terça-feira, 30 de agosto de 2011

Leni Riefenstahl



Leni Riefenstahl nasceu em Berlim, em 1902. Sua carreira artistica se inicia como bailarinha, ainda criança, e seria interrompida por uma lesão no joelho. Seu interesse se volta então para o cinema, e ela começa a trabalhar como atriz. Fez então uma série dos chamados Filmes de Montanha, onde atuava com roupas curtas e descalça, escalando montanhas íngremes e cheias de neve (vcs viram o Bastardos Inglórios? Lembram do papo sobre cinema alemão e filmes de montanha?).



Seu primeiro convite para dirigir um filme veio em 1932, com A Luz Azul, premiado no festival de Veneza. E então acontece a virada na sua vida. Adolf Hitler vê o filme e se impressiona. E então convida Leni para dirigir um documentário de propaganda para o partido nazista. O resultado saiu em 1934, com o soberbo O Triunfo da Vontade. Grandioso e monumental, o filme inaugura uma série de planos e movimentações de câmera até então inéditos. Até hoje é um filme assombroso e impressionante. Em 1936 filmou Olympia, uma cobertura dos jogos olímpicos de Berlim. Suas inovações técnicas são usadas até hoje em coberturas esportivas.






Daí a guerra acabou e a casa caiu. Leni foi presa e passou quatro anos presa num campo de concentração francês. Foi absolvida das acusações de guerra, já que nunca havia se filiado ao partido nazista e sempre se declarado politicamente ingênua. Foi enquadrada como simpatizante. Depois de liberta, nunca mais conseguiu dirigir um filme, já que sempre havia boicotes para o financiamento de suas produções. Começou a trabalhar como fotógrafa jornalística. Entre 74 e 76 publicou dois livros de fotos com guerreiros de uma tribo do Sudão. Com 80 anos, começou a praticar fotografia submarina. Em 2002, já com cem anos, lançou seu último filme, Impressões Subaquáticas. Morreu em 2003, aos 101 anos.









Vou tomar a liberdade de publicar um texto escrito pelo Inácio Araújo quando Leni fez 100 anos. Espero que apreciem. 

"Aos cem, Leni Riefenstahl ainda convive com ambiguidade

INÁCIO ARAUJO
da Folha de S.Paulo (22/08/2002)

Dos dois cineastas mais famosos da Alemanha nazista, foi bem diferente o destino para cada um. Veit Harlan amargou uns poucos anos de cadeia após a Segunda Guerra, mas voltou a trabalhar normalmente. A Leni Riefenstahl, que completa cem anos hoje, foi reservado uma espécie de desterro eterno do cinema.

Essa diversidade faz sentido. Harlan não era mais que um executante -embora executor de peças repulsivas, como "O Judeu Suss" (1940). Leni, ao contrário, é uma artista de pleno direito, e é justo que o pós-guerra imaginasse que uma câmera em suas mãos se transformasse em uma arma até perigosa.

Sua ambígua glória repousa basicamente sobre dois filmes, "O Triunfo da Vontade", relato de um congresso nazista em Nuremberg, e "Olímpia", filme oficial da Olimpíada de 1938. Ambos a credenciam como possivelmente a maior artista do Reich.

Ascensão espiritual
No primeiro, desenvolve o gosto pela simetria e pelas linhas retas. Nesse sentido, é quase um programa em imagens do Partido Nacional Socialista alemão: ordem unida, disciplina, espírito militar estão ali representados, duplicados pelas manifestações de massa de apoio ao regime. Se Albert Speer, arquiteto do Reich, esmerava-se em produzir edifícios sólidos, fincados na terra, Leni optou pelo inverso. Seu gosto pelas linhas verticais de certa forma produzia um efeito de ascensão espiritual, que soube vincular à pessoa de Hitler.

Em "Olímpia", Riefenstahl faz um elogio da cultura física que provavelmente cairia muito bem se exibida nas academias de cultura física que hoje existem em toda parte. A escrupulosa documentação dos feitos dos atletas e, em particular, da beleza de seus corpos e gestos respondia à perfeição aos ideais higiênicos do Terceiro Reich.

Restrições ao nazismo
O cinema de Leni foi considerado, não sem razão, a quintessência do nazismo, embora ela se defenda até hoje, dizendo que nunca foi membro do partido, nem partilhou de seu ideário. Sua ligação era com Hitler, a quem admirava profundamente. Se na cabeça de Hitler a idéia de criar um mundo belo era central, Riefenstahl foi, de longe, a pessoa mais apta a transformá-la em imagens na Alemanha nazista.

Daí toda a ambiguidade de sua fama. Não apenas desprezou como afrontou dignitários do Reich, a começar por Joseph Goebbels (responsável entre outros pelo cinema), mas o fez amparada por sua ligação pessoal com Hitler. Não partilhou das idéias de extermínio de outros povos (disse mesmo ignorar o Holocausto), nem acreditou na superioridade da "raça ariana". Teria passado a maior parte da guerra isolada, em sua casa no campo. Em sua própria visão, não foi mais que uma alemã comum, numa situação particular.

É possível. Mas o que vemos em "O Triunfo da Vontade" ou "Olímpia" não é bem isso. Seu espírito germânico está presente desde os tempos em que foi estrela dos filmes de montanha do dr. Arnold Fanck, nos anos 20. Seu último trabalho, um documentário de 2002, diz respeito ao mundo submarino, ao qual se dedicou nos últimos anos.

Tendo começado nas montanhas e terminado nas profundezas do mar, Riefenstahl chega aos cem anos como símbolo de um país que produziu, no século 20, o melhor e o pior: de F. W. Murnau e Fritz Lang às câmaras de gás."





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