sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Mulheres da Via Campesina, Rio Grande do Sul

Juro que eu não sabia dessa fita que rolou em 2006. Copiei este texto deste site, que não tem autor identificado. Pra quem não conhece o ocorrido, é fundamental conhecer, nem que seja só pra sacar que feminista não precisa se NEO. O fundamental é lutar contra a opressão. De todo o tipo.
E pra quem quer saber mais, vale a pena ler isso aqui, e também esse aqui, e esse outro aqui.
Na madrugada do dia 8 de março de 2006, 1.800 mulheres da Via Campesina realizaram uma das maiores ações contra o monocultivo de eucalipto no Rio Grande do Sul.
Organizadas, as mulheres ocuparam o viveiro hortoflorestal da Aracruz Celulose, em Barra do Ribeiro, município que fica a cerca de duas horas de Porto Alegre. Na ação, elas destruíram estufas e bandejas de mudas de eucalipto.
A repercussão do protesto ampliou o debate sobre a monocultura de eucalipto e chamou a atenção da sociedade sobre os malefícios sociais, ambientais e econômicos desse tipo de cultura.
Em 2006, ocorria em Porto Alegre o encontro internacional da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), entidade ligada à Organização das Nações Unidas (ONU), para discutir a Reforma Agrária e o desenvolvimento rural.
As mulheres decidiram que era o momento de tornar visível para os países que participavam da conferência as consequências do plantio em grande escala de eucalipto. “As mulheres decidiram tornar público o que estava acontecendo com a terra, com os camponeses e com a saúde para o conjunto da sociedade. Decidiram que a Aracruz simbolizava essa denúncia e por isso a ocuparam e destruíram as sementes e as mudas do viveiro como uma forma de chamar a atenção da sociedade para o que representa esse modelo de cultivo”, afirma Ivanete Tonin, militante do MST.
O eucalipto precisa de muita água para o seu desenvolvimento. Originário de regiões úmidas da Austrália, a planta precisa em média de 30 litros de água por dia ao longo de suas fases de crescimento.
No Brasil, embora tenha muitos rios, não existem vastas regiões úmidas, portanto, o plantio em larga escala de eucalipto pode provocar desequilíbrios nas águas existentes na região de plantio. Como consequência disso, vai faltar água para plantas, consumo humano e animal.
Como suas raízes são muito profundas, o eucalipto seca várzeas, poços artesianos e vertentes, trazendo o ressecamento da terra de superfície na região e altera o regime de chuvas. A falta de umidade torna mais difícil a entrada de frentes frias e ocorrem mais estiagens, como as registradas na região sul do Rio Grande do Sul, onde se planta muito eucalipto.

Na época, a Aracruz Celulose era uma das maiores produtoras de pasta de celulose do mundo. Em 2006, no Rio Grande do Sul, a multinacional possuía 300 mil hectares de terra para plantar eucalipto, planta da qual se extrai a celulose. A intenção da empresa na época era chegar em 2015 com 1 milhão de hectares de terra plantadas no estado. Mais de 95% da celulose é para exportação.
O produto serve para a produção de papel higiênico, papel toalha, lenço, papel absorvente e demais produtos descartáveis, de acordo com o Com informações do informativo “O latifúndio dos eucaliptos: Informações básicas sobre as monoculturas de árvores e as indústrias de papel”, da Via Campesina do Rio Grande do Sul.
Essa situação, simbolizada pela Aracruz, fez com que as mulheres decidissem pelo ato. “Essa ação visava denunciar o conjunto desse padrão de produção que transforma os países pobres apenas em colônia. Nós ficamos apenas com o prejuízo”, relata Ivanete.
O ato durante a semana do encontro da FAO teve a intenção de alertar para as ações do governo federal. “O governo veio à Porto Alegre fazer propaganda de que o Brasil estava acabando com a fome. Mas na verdade, esse governo representa os interesses do capital no campo. É um governo que não faz Reforma Agrária e defende o agronegócio”, afirma Ana Hanauer, da direção estadual do MST.

Protagonismo na luta de classe
Além de denunciar o êxodo rural provocado pela expansão das áreas de plantio da monocultura do eucalipto, a expulsão de pequenos agricultores de áreas próximas em função da escassez de água e também as péssimas condições dos trabalhadores que são contratados sem direitos trabalhistas pelas empresas do setor, a ação teve forte repercussão dentro dos movimentos sociais, da esquerda em geral e na sociedade.
“O 8 de março de 2006 representou a afirmação e a construção de um feminismo proletário contra o capital. Porque até o momento, o feminismo era muito vinculado à classe média, às demandas que são importantes para as mulheres, mas até então não tínhamos uma ação mais concreta de enfrentamento com o capital,” explica Claudia Teixeira, do Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD).
A ação na Aracruz deu maior visibilidade às lutas das mulheres da Via Campesina. Até então, eram realizadas atividades na linha de afirmar a presença das mulheres nos diferentes setores na perspectiva dos direitos.
Em 2006, as mulheres se tornam protagonistas do ponto de vista da luta contra o capital. “Chegamos no momento de dizer que neste modelo de sociedade, nem homens nem mulheres tem vida. Também teve uma repercussão grande nos movimentos, pois as mulheres assumiram todas as instâncias da preparação do ato. Isso representou um empoderamento interno muito importante”, avalia Sarai Brixner, do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).
A manifestação também representou a primeira ação mais forte de mulheres do MPA. “Significou, então, um marco histórico para nós enquanto movimento social de luta das mulheres. Além disso, a ação revelou toda uma discussão sobre monocultura, transgenia e contaminação do meio ambiente com a produção de pasta de celulose,” afirma Rosieli Lüdtke, do MPA.
Na Via Campesina, as mulheres entravam em um período de ascensão, no qual participavam mais intensamente dos debates e das questões de gênero. “Essa ação nos projetou enquanto referência política de luta de classe. Nós temos que responder a altura e isso ultrapassa as pautas dos movimentos”, explica Ana Hanauer, do MST.
A ação representou uma reafirmação de uma luta maior contra o capital e revelou, conforme Ivanete Tonin, a ideia de que não há libertação das mulheres sem a destruição do capital. “A libertação das mulheres não se dá somente dentro de casa, ou nas relações, mas sim na construção de um outro modelo de sociedade. A opressão das mulheres também está fundada na sociedade capitalista,” afirma Ivanete.
O protagonismo das mulheres na ação também é destacado pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). De acordo com Patrícia Prezotto, as mulheres começam a pautar a luta de classe. “Foi um momento histórico para as mulheres. Elas começam a não aceitar o que o capital impõe. Essa ação na Aracruz demonstra que as mulheres têm condições de fazer a luta contra o capital,” salienta Patrícia.
A identificação do capital como o grande inimigo da classe trabalhadora também foi um dos acúmulos da luta. “2006 traz para nós a discussão da celulose e da monocultura, pois até então a sociedade não percebia o mal que representa para a humanidade esse tipo de cultura,” relembra Izanete Maria Colla, do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC).
Além disso, a construção da luta na Aracruz representou uma unidade mais forte entre as mulheres. “As mulheres se identificaram, pois a ação bateu forte na questão do monocultivo, na questão ambiental e na questão do capital. Isso fortaleceu muito os movimentos que participaram da luta”, diz Elci da Paz, do MMC.
Outro aspecto é que a luta do 8 de março de 2006 questionou a opção de parte da esquerda de apostar no processo eleitoral para fazer mudanças estruturais na sociedade em favor dos trabalhadores. “Aquela ação mostrou que as mulheres pobres que se movimentavam ali não se sentiam incluídas neste poder, na medida em que denunciavam que o governo Lula liberou os transgênicos e flexibilizou as leis ambientais. Então é uma ação que também chocou por questionar essa via de fazer a luta”, explica Ivanete.

Reação da sociedade
As mulheres avaliam que em um primeiro momento, a reação imediata da população foi de criticar e condenar a ação, principalmente pela influência da mídia buguesa, mas depois que o assunto começou a ser debatido, muitas pessoas passaram a ver a ocupação da Aracruz com outros olhos e a apoiar a luta contra a monocultura do eucalipto.
“Uma parcela importante da sociedade entendeu que as mulheres destruíram aquilo que viria a destruir a terra, secar os rios e causas uma série de problemas, inclusive para a saúde”, avalia Neiva Vivian, do MST.
Entretanto, devido à abordagem da mídia que tratou a ação como um crime e defendeu a empresa, ignorando os impactos da monocultura para a população e o meio ambiente, alguns setores da sociedade ainda não compreenderam a importância da destruição do viveiro da Aracruz. “Nós não somos contra a tecnologia, nós somos contra uma tecnologia quando está apenas em função do lucro,” relata Ivanete.
A ação na Aracruz está no contexto da condição de barbárie que as mulheres vivem na sociedade capitalista patriarcal. “Nós mulheres não temos nada a perder. E esse gesto de radicalidade é compreensível a partir do momento em que as mulheres dizem que só o socialismo que resolve o problema das mulheres. Não é possível remediar em nenhum aspecto. Não tem reforma, não tem ação governamental que amenize a condição de opressão da mulher na sociedade em que a gente vive”, sintetiza Ana.
E de bônus, um vídeo sobre elas.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Dani Calabresa



Lendo um post recente da amiga Roberta Gregoli, lá no Subvertidas, fiquei pensando nas humoristas mulheres do nosso Brasil. Me lembrei de poucas, mas talvez seja fruto da minha ignorância no meio, já que não sou muito de caçar piadistas no youtube. A talvez mais talentosa comediante da atualidade, explica o motivo de haver tão poucas mulheres no meio, aos 8 minutos desta impagável entrevista ao Danilo Gentili.


Daniella Maria Giusti nasceu em São Bernardo do Campo, em 1981, mas se mudou logo para Santo André. Começou no teatro ainda criança, aos 5 anos, quando sua irmã mais velha, Fabiana Giusti fez uma peça no colégio e chamou-a para fazer uma participação. Sua irmã interpretou Branca de Neve, enquanto ela ficou com o papel do anão Dunga.Quando adolescente se declarava tímida e disse em entrevista que o curso de teatro ajudou a perder a timidez. Ficou famosa no estado de São Paulo ao fazer parte do elenco do Comédia Ao Vivo, porém começou a ganhar fama nacional quando participou dos programas de televisão "Sem Controle" do SBT e "Pânico na TV" da RedeTV!.
Aqui, uma participação sua no Pânico na TV

Publicitária por formação, participou do Quinta Categoria na MTV Brasil no ano de 2008. Hoje ela é âncora do programa "Furo MTV", participou do sitcom Furfles e atualmente, participa do Comédia MTV, ambos da MTV Brasil, além de fazer apresentações de Stand-up comedy no Comédia Ao Vivo, no Teatro Renaissance, em São Paulo. Se casou em 2010, com o cara mais engraçado do mundo, o Marcelo Adnet. 

E a seguir, mais uma entrevista dela, agora no Programa do Jô.



A seguir, trechos de sua curta entrevista para a Playboy:
Qual foi o lugar mais bizarro em que você já se apresentou com seu show de stand-up?                                                                                                                                               Uma vez colocaram meu microfone bem na beira de uma piscina e eu passei o show inteiro com medo de dar um passo pra trás e cair lá dentro. E também me apresentei numa fábrica desativada em cima de uma guarita de porteiro, parecia uma piqueteira em uma grave. O povo me assistindo lá embaixo em pé, e eu de saia.
A predisposição das pessoas para rir nos seus shows é inversamente proporcional ao tamanho da sua saia?  
Acho que não. Quando eu era desconhecida e aparecia de saia curta no show, acho que as pessoas até pensavam: “Deixa eu ver quem é essa menina de saia”. Os homens ficavam um tempo olhando as pernas, vendo se eu estava de farol aceso, pensando se me pegariam. Mas hoje o cara chega ao show sabendo que é a mina da MTV, já sabem que a Calabresa é louca. Então acho que eu posso até estar de biquíni que as pessoas nem vão olhar, só vão escutar as merdas que eu tenho a dizer.
É bom escrever texto de comédia quando você está bêbada? 
Sabe que eu nunca fiz isso?!? Beijo desconhecidos, peço as pessoas em casamento e caio no chão, mas escrever bêbada nunca aconteceu.
Mulher adora homem que a faz rir. A recíproca é verdadeira?        
Não, homem geralmente não quer uma mulher que fale palavrão, que seja mais engraçada do que ele. Eles querem uma gostosa comportada. Às vezes você têm um amigo super engraçado que arranja uma namorada séria e sem graça, mas que é linda. Minhas amigas engraçadas sofrem pra arrumar homem.






sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Eva Ionesco




Já escrevi anteriormente sobre a mãe de Eva, Irina Ionesco. Recomendo a leitura do post dela antes deste.

Eva nasceu em 1965, na França, e logo aos 3 anos tornou-se a modelo fotográfica favorita de sua mãe. As fotografias eróticas feitas por Irina Ionesco de sua jovem filha Eva têm sido uma fonte de controvérsia desde que apareceu pela primeira vez na década de 1970. Mas Eva também foi modelo para outros fotógrafos, como Jacques Bourboulon.


Ela é a mais nova modelo que já apareceu nua em uma revista Playboy, uma vez que foi apresentada aos 11 anos, em outubro de 1976, numa edição italiana da revista com fotos de Bourboulon. Outra de suas fotos nuas saíram em 1978, na edição de novembro da edição espanhola da Penthouse, numa seleção de fotografias de sua mãe.



Eva Ionesco fez sua estréia no cinema com a idade de 11, em 1976, no filme O Inquilino, de Roman Polanski. Pouco tempo depois, ela estrearia diversos filmes, como Maladolescenza, de 1977. Neste ano sua mãe perdeu a guarda de seus filhos e Eva Ionesco foi criado pelos pais do designer Christian Louboutin. Ela tentou três vezes processar a mãe por estresse emocional, e o julgamento ainda está em curso pelos tribunais franceses. Em 1998 a polícia francesa confiscou centenas de fotografia dela no apartamento de sua mãe em que ela aparece com a idade de cinco em poses sugestivas e em completa nudez.


Sua história serviu de inspiração para o bebê Louis Malle filme Pretty. [5] Em 1980, ela participou da prestigiada escola de teatro Amandiers, dirigido por Patrice Chéreau e Pierre Romans. Em 2010, dirigiu seu primeiro filme, My Little Princess, estrelado por Isabelle Huppert, onde ela conta a tensa história da relação entre ela e sua mãe.


A seguir, reproduzo a entrevista concedida a Paulo Portugal, para o site português C7nema, em julho de 2012.

Quando foi que lhe ocorreu a ideia de fazer este filme? Foi já há bastante tempo?

Sim, sim. Há muito que queria contar esta história, queria fazer um filme sobre esta história. Enfim, não era bem esta história, era algo muito mais vasto. Mas acabei por me centrar na ligação com a filha... Que era vista como uma boneca. 

Tanto quanto sei, este filme faz parte de algo mais vasto...


Sim, penso numa trilogia. Como um romance, mas como ponto de partida para fazer um filme. Por isso concentrei-me na ligação da mãe com esta filha pequena que é interpretada pela Anamaria (Vartolomei) e a Isabelle (Hupert). Foi algo muito difícil, muito doloroso, muito complicado...


Mas era algo que tinha de fazer.

Sim, era um dever que tinha. O filme não é um jogo de espelho onde me revejo, mas algo que sinto que devo fazer. Como uma obrigação. Eu tinha de contar esta história.


Alguma vez perdoou à sua mãe o que fez?

Não. Sabe quando alguém lhe faz muito mal, e nunca regressa para pedir desculpa. Nunca me entregou as fotos eróticas. Nunca pediu desculpa, nunca, nunca, nunca...


Refere-se às fotos que circulam na Internet?

Sim, mas nunca farei qualquer exposição delas. Sabe, apenas desejo uma coisa: que ela morra. Sempre quis que ela morresse e ficarei feliz quando desaparecer.


Bom, não sei o que dizer...

Há pessoas que se lamentam porque perderam um amigo ou membros da família. Pode ser triste, mas é algo que eu não conheço. Sei que a minha mãe está muito doente, mas não quero saber. Só quero que desapareça. Compreende?


Tento compreender. Regressemos então ao passado. Lembra-se quando tinha então essa idade...

Tinha três ou quatro anos.


Do que se lembra desse período?

Quando são os nossos pais que nos manipulam desde o inicio, não temos consciência de pensar o que sabemos hoje. Uma máquina fotográfica era apenas aquilo.


Não tinha a noção de que era algo pouco natural?

Não com três, anos, não com quatro anos, não com cinco anos. As crianças sorriem, mesmo quando nos fazem mal. Quando são os nossos pais que fazem isso, não podemos falar, pois não conhecemos as regras do mundo. Isso é criminoso. É um grande crime. Não serei a primeira.


Em que momento...

...como se pode manipular uma criança, pedir-lhe para abrir as pernas aos três anos e mostrar essas fotos sem que a criança saiba. Utilizá-las a vida inteira e vendê-las. Esse ato é monstruoso. E merecedor de punição.



Com que idade começou a aperceber-se de que algo não estava bem?

Claro que me apercebi que algo não estava bem. Sobretudo que havia coisas que não estavam bem na cabeça desta mulher. A minha mãe era uma pessoa com grandes neuroses. Quando vemos hoje as fotos pensamos que é arte ou porcaria? A menina está triste e tem as pernas abertas. Porquê? Pode dizer-se: é belo, é barroco. E isto durante dez anos! É preciso ser-se doente.


Para si, foi igualmente doloroso fazer este filme?

Não. A fazer este filme, tinha de ser algo muito lúdico. Quando fazemos o filme não estamos a pensar na dor. Não podemos.


Compreendo, porque a realidade não é bem o que é mostrado.

Claro. Aqui a história é bem diferente, é uma rapariga que se dá conta de si e acaba por chamar a si o seu destino. Não é a mesma coisa.

Alguma vez tentou compreender o que se passava na cabeça da sua mãe?

Sim, tentei fazer isso. Aliás, fiz este filme para tentar compreender. E para que não se repita. Tinha muito medo de fazer algo que fizesse mal ao meu filho.


Ele tem que idade?


Já é crescido, tem 17 anos. Mas tinha receio de reproduzir algo que o pudesse enfraquecer. Apenas do ponto de vista das pulsões sexuais. Mas comecei a pensar nesta história quando ele tinha quatro anos. O que tentei fazer com este filme foi remontar esse mecanismo inconsciente. Ela mesmo está ligada ele, pois viveu também um incesto.


Portanto, uma parte dolorosa da sua vida.

De certa forma, ela reproduziu comigo  o que lhe sucedera. Ela foi levada para o quarto com a mãe e em vez de dizer que ela era sua filha disse-lhe que era a sua irmã. Então percebemos que optou por se fazer observar. É essa a sua pulsão artística. Uma pulsão de desejo, de morte. Mas não é premeditado.

Mas não deixa de ser uma exploração sexual...

Sim, é bastante violento. Nem sequer é uma linguagem articulada. Fazer fotos barrocas, muita gente pode fazer. Pessoalmente, não acho isso artístico. Eu acho que arte deve ajudar o mundo, e não contrário.  Não vejo o que ela fez de bem.

Como encara o seu filho o passado da mãe. Calculo que tenha visto todas essas imagens...


Claro que está a par de tudo. Conhece o meu ponto de vista e disse-me que ficou muito orgulhoso por eu ter feito este filme. Disse-me que eu era a Princesa dele. E, sabe, estivemos em Portugal. Aliás, vamos sempre durante o Verão.

Ai sim, onde?


Em Carvalhal, a 150 kms de Lisboa, na costa. É lindo, vamos todos os anos.

A escolha para os intérpretes foi mais ou menos óbvia para o filme?

Sim, foi evidente. Há muito que queria a Isabelle. É uma actriz enorme e sabia que ela poderia saber interpretar a personagem. Deu-me toda a confiança e a força.

E a Anamaria?


Ela tinha medo da Isabelle, porque não a conhecia. Vinha da Roménia. Foi preciso falar muito com ela e explicar tudo. Todas as cenas foram ensaiadas.
Eva e seu filho, em foto de Veronique Vial

E ela sendo jovem tinha essa consciência dos limites que estavam em causa?

Eu expliquei-lhe que teria de ser uma menina que tirava a roupa, mas que nunca estaria nua no filme. E que tirava fotografias. Era uma história de chantagem, em que se despia para ter roupas bonitas. Trabalhamos todas as nuances.

Falou de uma trilogia. O que poderemos esperar do que falta?


O segundo filme será uma crónica sobre as histórias de amor adolescente nas festas nos famosos clubes noturnos de Paris...



Clubes eróticos?

Eróticos? Nem por isso. Mais grotescos.


Está em que estado de produção?

Está na parte da escrita, está metade escrito.


E já tem título?

Talvez «A Última Dança». Agora já será adolescente.


Sempre com a Anamaria?

Sim. Faz parte do projeto. Vamos ver se consigo chegar ao terceiro filme.


Mas como é que desenha esta trilogia?

O primeiro filme é a relação mãe e filha; o segundo são os amores e a deceção, também uma história diferente da sexualidade.


Imagino que terá também um lado pessoal...

Sim, tem um lado pessoal. A terceira parte será a procura do pai. Isso será mais contemporâneo.


Nunca falámos do seu pai...


É algo voluntário, porque faz parte de um outro capítulo. Mas ele era muito misterioso. Diz-se até que seria um espião. Talvez por isso o visse tão poucas vezes. Na primeira parte, os homens não fazem parte da história.


Enquanto fotógrafa, que opinião tem do trabalho fotográfico da sua mãe?

Pessoalmente, continuo a achar que é um trabalho um pouco pedófilo. Para além do lado barroco que se possa entender. É só isso que conta, uma menina a mostrar o seu corpo. É artístico? Não, é pedófilo. Só tem a ver com o desejo. Por isso, é pedófilo.