sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Sasha Grey


Marina Ann Hantzis, mais conhecida como Sasha Grey, nasceu na Califórnia, filha de um mecânico com uma funcionária do Estado. Seus pais se separaram quando ela tinha cinco anos, e ela foi criada com sua mãe. Passou por quatro escolas de ensino médio, odiando cada uma pela qual passou. Na última delas ela fez aulas de cinema, dança e atuação. Formou-se aos 17 anos. Ela trabalhou colocando mesas em uma churrascaria por alguns meses, conseguindo economizar 7 mil dólares para se mudar para Los Angeles.


Em maio de 2006 mudou-se para Los Angeles e começou sua carreira em filmes adultos (nosso velho e conhecido pornô), logo após completar 18 anos. Originalmente ela usou o nome Anna Karina, tomado da atriz francesa antes de decidir sobre o seu nome presente. O nome " Sasha " foi tirado de Sascha Konietzko da banda KMFDM e "Grey" do romance de Oscar Wilde, O Retrato de Dorian Gray. Sua primeira cena foi uma orgia com o mítico Rocco Siffredi para o filme Os Fashionistas 2, de John Stagliano .


Ela logo trouxe a atenção pra si ao improvisar com Rocco uma cena em que ele dá um soco no estômago dela. A partir daí ela foi trabalhando muito e ganhando seu espaço. Menos de seis meses depois ela já era apontada por revistas especializadas como a grande revelação do pornô. Em 2007 e 2008 ganhou diversos prêmios, sendo a pessoa mais jovem a ganhar o AVN Adult Movie Awards. 


Vejam esse vídeo da Vice, um misto de entrevista e ensaio com Richard Kern, onde Sasha afirma que se considera uma artista performática, fala sobre como ela encara com profissionalismo o seu trabalho.


Durante cinco anos de trabalho, Sasha fez 270 filmes e ganhou 14 prêmios. 


Em 2011 ela anunciou sua aposentadoria. 


Em meados de agosto de 2013 a Sashinha veio ao Brasil para o lançamento da tradução de seu livro, Juliette Society. Neste vídeo da tv folha vc pode ver um pouco do impacto da vinda dela aqui (a partir do minuto 8). E o vídeo a seguir é da entrevista dela pro Danilo Gentili.




segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Clara Charf


Clara Charf nasceu em 1925, em Recife. Se considera comunista desde criança, mas a militância junto ao Partido começou aos 20 anos. Trabalhava de aeromoça enquanto fazia trabalhos pro Partidão. Um dia encontrou Marighella na porta do Partido Comunista no Rio de Janeiro. Começaram a namorar em pouco tempo. Clara deixou o trabalho de aeromoça para trabalhar num gabinete do partido na Câmara dos Deputados. Logo o Partido Comunista se tornou ilegal e o casal passou a viver na ilegalidade. 
Se interessou pela história? Então leia a entrevista concedida por Clara à Nina Lemos, da Revista TPM:


Tpm. A vida do Marighella virou filme, livro e música dos Racionais MCs e do Caetano Veloso. Como está sendo para você esse reconhecimento?Clara Charf. Eu nem esperava mais [risos]. Quantos anos se passaram, meu Deus! E agora o Ministério da Justiça deu a anistia a ele, que maravilha. Quando me ligaram de Brasília e falaram que isso iria acontecer, quase caí para trás. Desde o governo Lula as coisas começaram a melhorar muito. As pessoas agora estão percebendo a importância do Marighella. Você viu o filme, que maravilhoso? Adorei. A música do Caetano ainda não ouvi. Me disseram que vai ter. Estou esperando [sorrindo].
Como você virou comunista? Eu morava em Recife. Éramos uma família de judeus russos pobres. O pai do [fotógrafo] Bob Wolfenson, o Jacob, era filho de um amigo do meu pai. Lembro que uma noite o meu pai chegou em casa e falou: “O filho do seu Davi está preso”. Fiquei escandalizada. Perguntei: “Ele é ladrão?”. E meu pai: “De jeito nenhum”. E não explicou mais nada. Logo que foi solto chamaram a gente para um chá na casa deles, para comemorar. Perguntei para o Jacob: “Por que você foi preso?”. Ele me chamou em um canto e disse: “Porque sou comunista. Mas não posso falar agora. Depois vou na sua casa e te explico”.
Ele foi? Foi. E ele foi responsável pela minha politização [risos]. Falo isso para o Bob: “A culpa é do seu pai”. O Jacob falou [Clara começa a chorar]: “Um dia vai ter uma sociedade em que todos serão iguais, e aí não vai ter dinheiro, vai ser tudo troca”. E eu: “Mas como assim?”. Ele: “Ah, se você precisa de um sapato, a gente troca de acordo com a necessidade”. Eu disse: “Ué, então também sou comunista!”[risos]. Depois, quando fui trabalhar em um banco como datilógrafa, me chamavam para reuniões de mulheres que trabalhavam em fábricas, reuniões de luta por melhores salários. Aí entrei na história, queria participar daquela luta.
Como foi a sua infância? Meu pai era mascate. Minha mãe fazia tudo em casa. Lembro dela cozinhando naquele fogão a lenha, ao mesmo tempo abanando com a mão para que a casa não ficasse tomada pela fumaça. Meu pai não era religioso. Nunca seguimos as tradições judaicas, minha formação era democrática. Você tinha que ser sincero, honesto, tinha que trabalhar. Minha mãe queria que eu fosse pianista, então, alugaram um piano para que eu pudesse estudar, já que não podiam comprar. Ia um professor lá em casa e me ensinava. Fiz o primário e o ginásio em escola pública. Era um ambiente que tinha meninos e meninas. Tive ótimos professores, tanto que foi lá que aprendi inglês, e tradutora acabou sendo uma das minhas profissões.
Você também trabalhou como aeromoça. Eu queria ser aviadora. Como não podia, porque não existiam aviadoras naquela época, decidi ser aeromoça. Agora, imagina isso na cabeça do meu pai. Minha mãe morreu com 40 anos, meu pai me queria perto dele. Mas eu já estava começando a me envolver com atividades políticas. Aquelas histórias de que a filha do [Luiz Carlos] Prestes nasceu no campo de concentração, todas essas notícias começaram a mexer muito com a gente. Peguei uma pneumonia e tive que sair do trabalho, aí decidi mudar para o Rio de Janeiro para tentar ser aeromoça. Meu pai só falava: “Não se meta em política”. E eu fui me metendo cada vez mais [risos].
Foi quando você conheceu o Marighella? Conheci o Marighella na sede do Partido Comunista. Meu pai não sabia de nada, claro. Eu trabalhava como aeromoça em uma companhia chamada Aerovias Brasil. Como já era do partido, quando tinha viagem, ia e perguntava: “Tô indo para o Ceará, querem que leve alguma coisa?”. Fiz isso durante muito tempo. Em uma das vezes, fui pegar o material [documentos], entrei fardada e vi aquele cara parado na porta do elevador. Eu olhei. Ele olhou. Me chamou a atenção aquele preto enorme. E disse para um companheiro: “Vi um cara alto lá embaixo!”. E ele disse: “Ah, deve ser o Marighella”. Foi a primeira vez que escutei esse nome. Nem sabia que ele existia. E ele fez a mesma coisa quando subiu, perguntou quem era “aquela” moça.


E ele convidou você para sair? Convidou nada! Continuei sendo aeromoça. E fui convocada para a inauguração de um voo que ia para Miami. Nesse voo, o comandante era integralista e ele não me suportava. Eu era a única mulher no voo e falava sobre liberdade, igualdade. Ele tentou me dar uma cantada, e eu, nada. Você sabe que naquela época algumas aeromoças saíam à noite com a tripulação, né? Hoje não é mais assim. Ele tentou, não conseguiu, ficou com ódio. O avião voltou quase vazio e combinei com meus colegas: “Um de vocês dorme, eu fico com outro, depois a gente troca”. Acharam ótima ideia. Quando ele me viu deitada, ficou louco. Escreveu em um relatório que eu era relapsa. Todos os garotos me defenderam, mas não teve jeito. Pensei: “Não vou ficar nessa profissão lidando com esse homem fascista”.
O que você foi fazer? Voltei para o Rio e tinham montado a fração parlamentar. Era uma espécie de escritório que decidia e redigia todas as propostas, discursos e ações dos parlamentares do Partido Comunista. Os deputados só podiam levar para a Câmara o material que fosse aprovado lá. Foi um trabalho maravilhoso. E o Marighella, que fez parte da primeira bancada de comunistas do Brasil, era responsável pela fração. Foi lá que começamos a namorar e que fiquei amiga do Jorge Amado. Mas isso durou dois anos e passamos para a clandestinidade [nos anos 40, na ditadura de Getúlio Vargas, que durou de 1937 a 45] .Começamos a ser perseguidos e fomos morar juntos. Mas nosso plano antes era casar de papel passado. A partir daí, ficamos entrando e saindo da legalidade. Essa era a nossa vida.
Como seu pai lidou com o fato de você virar companheira do Marighella? Ficou desesperado [risos]. Falava que o Marighella era “preto, cristão e comunista” e que tinha me criado para casar. E ele foi até o Rio me pegar à força. Aí, fugi, ajudada por uma amiga, a Adalgisa. O pessoal do partido me mandou uma passagem e fui para a casa de uma comunista alemã no Rio. Daí me mudei com o Marighella e fizemos uma vida juntos.
Como era viver na ilegalidade, dava para ter rotina? Não era normal. Você não podia dar o seu nome, inventava uma profissão. O seu companheiro, no meu caso, saía sempre à noite, trabalhava de madrugada, porque era procurado e não podia ser visto durante o dia. Eu era a cidadã pacata, que fazia as compras. Saía com a cestinha, comprava verdura, era simpática com todo mundo.
Onde moravam nessa época? Morávamos no Ipiranga [zona sul de São Paulo], eram casas simples. Me chamava Vera. Não podíamos fazer amizade com os vizinhos. Tinha uma vizinha italiana que se sentia muito sozinha e tinha um neto, que vivia com ela. Eu não podia me aproximar deles. Passava o dia ouvindo a rádio Gazeta bem alto. Usava o rádio para disfarçar e falava para todo mundo que meu marido era viajante. Um dia, estou em casa e toca a campainha. Era a senhora italiana: “Dona Vera, a senhora sabe dar injeção?”. Fiquei sem saber o que falar. Eu sabia. Ela tanto insistiu que dei. Virei santa para ela. Quando saía para atividades políticas e ficava dias fora, ela molhava minhas plantas.


Como você ficava sabendo dos trabalhos que tinha que fazer pelo partido? O próprio Marighella me transmitia as missões. Em uma delas, peguei uma pneumonia, parecia que ia morrer de febre. Ele ficou desesperado, não podia ligar para um médico. Falou com um companheiro farmacêutico que disse: “Vou parar meu carro na esquina, de madrugada, você enrola a Clara em cobertores e traz ela”. Fui carregada, ardendo em febre, e esse companheiro ficou comigo na casa dele. Conseguiu que médicos simpatizantes do partido fossem lá. Tínhamos toda uma rede. Fiquei três meses nessa casa, me trataram como se eu fosse uma neta. Eles eram mais velhos e tinham três filhos. Os pais não diziam nem para os filhos quem eu era, porque eles podiam falar sem querer na rua. Inventaram que eu era uma parente. Lá eu me chamava... olha, tive tantos nomes que nem lembro [risos].
Como sabiam qual era a hora de mudar de casa, de nome? O Marighella era secretário-geral do partido, então ele mesmo sabia quando vinha a ordem de mudar. Quando estávamos havia muito tempo num lugar, começávamos a nos olhar e a gente falava: “Está na hora de largar esse aparelho”. Só podíamos levar uma mala pequena. Não levávamos móveis. Não levava roupa de cama, nada. Só o básico.
Você era vaidosa? Claro que não, menina. Ninguém podia ser vaidoso. Não tinha tempo para isso, imagina. Você tinha que andar limpa, arrumada. Não podia andar com uma roupa rasgada, tinha que ser discreta. Mas vaidade? Ninguém tinha tempo para isso.
O que era mais difícil na vida ilegal? Era muito difícil viver com a polícia atrás de você. Ainda mais sabendo que você não tinha feito nada. Pelo contrário, você estava ajudando o seu país. O que facilitava é que eu vivia com o Marighella, que era uma pessoa maravilhosa, humanista. Dividíamos todas as tarefas da casa. Logo ficou combinado que ele ficaria com as coisas mais pesadas. Ele adorava mexer com água, então, lavava o chão, lavava roupa. E eu passava. Até que um dia ele saiu e, quando voltou, eu estava passando roupa. Ele olhou, deu uma volta e falou: “Vamos combinar uma coisa. Não passe enquanto eu não estiver em casa”. Eu disse: “Por que, se você não sabe passar?”. Ele respondeu: “É que, quando você for passar, vou ficar ao lado, lendo para você” [começa a chorar e pede desculpas]. É que essas coisas mexem muito comigo.
O que ele lia para você? Lia o que interessasse: poemas, discursos, notícias importantes do Brasil... Imagina se a essa altura do campeonato vou lembrar exatamente!
Quando saía, você tinha que se disfarçar? Fui uma das primeiras a perder o direito de cidadã. O meu nome estava na primeira lista de pessoas que perderam seus direitos civis, quase no topo. Aí, o Marighella falou: “Clara, você não pode sorrir nas ruas, senão vão te reconhecer”. E parei de sorrir. Depois fui para Cuba, e lá também não podia sorrir nem tirar foto, por medo de que nos descobrissem e tivéssemos que voltar ao Brasil. Então, você imagina como foi quando voltei e todo mundo queria tirar foto comigo sorrindo. Achei que isso nunca fosse acontecer [chora].
Seu pai nunca chegou a conhecer o Marighella? Quando o JK [Juscelino Kubitschek] era presidente, a gente tinha uma vida legal, morava no Rio de Janeiro, no Catete, e um dia meu pai foi conhecer o Marighella. Imagina, se apaixonaram. Ele acordava e ia comprar as frutas para o meu pai no café da manhã. Meu pai se deu conta da grande figura que ele era. Tanto ele como a minha irmã, do segundo casamento do meu pai, a Iara, ficaram lá em casa e próximos de nós. Mas logo veio a repressão e acabou com tudo.
Vocês foram ilegais na ditadura do Vargas, mas voltaram a viver na legalidade nos anos JK. Como foi? Na década de 50, fomos legais, o Carlinhos [Carlos Augusto Marighella], filho do primeiro casamento do Marighella, morava com a gente no Rio. Adoro ele, temos uma relação de muito carinho um pelo outro. Ele ficava no colégio Batista e passava o fim de semana com a gente. Tínhamos uma vida normal. O Marighella achava que você precisava ter vigor físico, que tinha que estar sempre em forma para o caso de alguma coisa acontecer. E também era muito estudioso. Mas a pronúncia dele para idioma estrangeiro, vixe Maria, era péssima. Um dia ele chegou em casa e trouxe um aparelho de madeira, como se fosse um remo. Ele sentava para fazer exercício com aquilo. Achei ótimo. Mas, ao mesmo tempo, para não perder tempo, ele queria estudar inglês [risos]. Ele colocava um aparelho no ouvido, como se fosse um rádio, e ouvia, repetia as palavras e fazia os exercícios. O Carlinhos chegou em casa e morreu de rir.


O Marighella era comandante da ALN (Ação Libertadora Nacional) e praticava a luta armada. Você andava armada? Sabia de tudo, claro, mas não participava das ações armadas. Nunca tive arma nem aprendi a atirar. Era uma organização. E, dentro da organização, o papel do Marighella era um, o meu, outro. Eu fazia o trabalho de apoio tático. Cada um tinha sua função. Mas acho engraçado chamarem a gente de terrorista. Terroristas eram os militares. Eles que começaram a prender as pessoas, a torturar. Eles começaram uma guerra. 
A gente apenas se defendeu. Se eles não tivessem começado a matar os companheiros como mataram, nunca teria havido da parte da resistência uma ação armada. É isso: eles começaram. Nós só tentamos nos defender e melhorar o país, lutar pela democracia.
Você sabia de tudo o que ele fazia, mesmo das ações mais sigilosas? Não. O Marighella não falava abertamente. Um dia ele chegou em casa e disse: “Preciso estudar inglês porque vou viajar”. Eu não perguntei para onde.
Como conseguiu não perguntar? Minha filha, porque não existia a possibilidade de fazer essa pergunta. Era uma norma. Era melhor não saber, porque senão você podia ser presa e acabar entregando na tortura. A única coisa que ele me disse foi que precisava aprender inglês em um mês. Então, ficamos um mês conversando em inglês [Clara teve bons professores na escola e tinha facilidade para a língua] e ele aprendeu um pouco. Ele viajou e eu fui presa.
Como aconteceu? A direção do partido achou que eu poderia ser professora de um curso para ferroviários em Campinas. Falaram que eu seria recebida pelos companheiros em Campinas. Aceitei. Estava com problema de vista e precisei comprar óculos. Quando experimentei, perguntaram o meu nome e saiu Marta Santos. Nem pensei. Fui para Campinas e levei o recibo no bolso. Fui com uma sacola cheia de livros. Livros marxistas, claro. Quando cheguei, o companheiro disse que estava sendo procurado pela polícia. Olha a loucura que eles fizeram! Ele me levou para a casa de uma companheira e, chegando lá, ela não queria que eu ficasse. Ele foi procurar outra casa. Chegamos lá, a casa estava fechada. A essa altura, a polícia da cidade começou a achar a movimentação esquisita. E ele com mandado de prisão. A polícia o reconheceu, ele conseguiu fugir. Eu fiquei, fui presa e comecei a gritar: “Abaixo a ditadura de Getúlio Vargas”. Fiquei com ódio. Na delegacia, não tinha preso político, só ladras, prostitutas etc. O guarda entrou, me olhou e perguntou meu nome. Falei Marta Santos, e disse que tinha ido fazer tratamento de saúde em Campinas. Ele percebeu que era tudo mentira, né?


Como foi sua vida na cadeia? Fiquei uns quatro meses presa [na ditadura de Getúlio Vargas, entre 1937-45]. Me levaram para a única cela disponível para mulheres. E o delegado disse para as outras: “Não falem com essa mulher que ela é comunista” [risos]. Uma chegou para mim e perguntou: “O que é comunismo?”. Eu disse: “Comunismo é dividir as coisas que você tem com as outras pessoas. Por exemplo, se eu tenho dois rádios, posso te dar um, porque só preciso de um”. E ela respondeu: “Então sou comunista. Fui presa porque tinha dois rádios na casa onde eu trabalhava e roubei um” [risos]. Fiquei queridíssima pelas presas. Daí me tiraram da cela com medo de eu fazer uma revolução com elas. Me levaram para uma cela sozinha. Ficava deitada em um colchão podre, sem casaco, sem nada. Começaram a trazer delegados de São Paulo para tentar me reconhecer, e nada. Perguntavam meu nome e eu dizia: “Marta Santos”. Um delegado falou: “Sua comunistinha de merda. Se você não falar a verdade, vamos acabar com você”. Se eu falasse, ia ter que contar tudo, que eu era a Clara Charf. Seria uma tragédia.
E como saiu? O partido me mandou um recado de que eu teria que dizer meu nome. E começaram a se mobilizar para me tirar. Um dia, quando não aguentava mais, disse: “Falo meu nome, mas na frente do juiz”. Um dia depois, apareceu um juiz. Pensei: “E agora? Vou ter que falar!”. Nunca esqueci a cara dele. Senti um ódio quando vi aquele juiz do lado de fora e eu presa naquele lugar horrível. Tive um ataque na cela, joguei tudo no chão. Avisei o advogado que só falaria fora da prisão. Me levaram para o Tribunal de Justiça e quando disse que era Clara Charf foi um escândalo.
E aí? Voltei para a cadeia e saí semanas depois. Fiquei com medo e disse que só sairia na companhia do responsável pela associação de imprensa de Campinas. Não sei por que falei isso. Mas, no dia seguinte, apareceu o cidadão e me tirou de lá. Me levou para a casa dele [começa a chorar]. Imagina, tinham preparado uma cama maravilhosa para mim, banho quente, comida quente. Que pessoas maravilhosas. Me deram a cama deles para eu dormir [chorando]. Ele me levou até o Rio de carro, avisou o Partidão. E foi lá que reencontrei o Marighella, que estava na China quando eu estava presa.
Por que deixaram a senhora livre? Nem eu sei ao certo, só sei que o advogado conseguiu um habeas corpus.
Como foi o reencontro? Ele só chegou uns dias depois da soltura. Antes de dar um abraço nele, perguntei: “Escuta, você pode me dizer onde é que você estava?”. E ele: “Na China”. E eu: “Na China? Mas como você falou inglês com os chineses?”. E ele: “Ué, eles também não sabiam falar [risos]”. Ele se entendia desenhando. Morri de rir com as histórias dele. Ele era um grande desenhista. E a partir daí passei a ser conhecida, isso nos anos 50.
Como era a vida de vocês na legalidade? Tivemos um momento de muita felicidade e alívio com a eleição do João Goulart [em 1961]. Comecei a trabalhar na liga feminina, mas isso durou pouco. Logo veio o golpe. Invadiram nosso apartamento. O Marighella pressentiu tudo. Disse: “Vamos descer pela escada”. Eles subiram pelo elevador. Quando saímos, fomos para a casa de um trabalhador conhecido nosso. Marighella foi encontrar a zeladora para pegar umas roupas e levou um tiro. E foi preso. Só fui saber no dia seguinte, quando um companheiro me deu a notícia. Fiquei na agonia. Quando ele foi solto, fomos para um sítio, onde ele escreveu o livro Por que resisti à prisão. Ele foi preso muitas vezes. E sempre foi conhecido por ser muito corajoso. Nunca falou nada na tortura.
Essa última ditadura que você viveu, após o Golpe de 64, foi a pior? Toda repressão é horrível. Mas ali era um caso de vida ou morte. O golpe endureceu e Marighella passou a ser o homem mais procurado do Brasil. Nossa vida era muito perigosa. No dia em que ele foi assassinado, ele saiu para fazer uns contatos. Alguns deles eram com padres, para tentar tirar gente do Brasil pela fronteira da Argentina. Ele não sabia que os padres já tinham sido presos, torturadíssimos e que acabaram entregando ele. Eles mataram o Marighella como se fosse um troféu. Era o inimigo número um da causa deles.
Como soube da morte? Estava em casa, à noite, esperando o Marighella voltar. Aí um companheiro chegou e falou: “Vamos sair daqui correndo. Você sabe o que aconteceu?”. E me contou [começa a chorar e para de falar]. “Ele foi morto, não é?” “Foi. Assassinado.” Me levaram para a casa de uma companheira maravilhosa, depois para várias casas. Até que montaram um esquema e consegui ir para Cuba. Fui com a roupa do corpo e carregando um retrato do Marighella, que foi a única coisa que sobrou do nosso apartamento [no dia da entrevista, Clara não encontrou a foto]. O resto todo foi queimado. Fui abraçada com essa foto para Cuba. Não a largava por nada.
Como foi a sua vida em Cuba? Em Cuba eles eram maravilhosos. Colocaram a gente numa casa. Como era meu nome lá mesmo? Era Claudia Gonzales. Tinha amigos, mas não podia falar muito sobre a minha vida. Fui tradutora de cabine. Aprendi espanhol. Foi uma experiência profissional maravilhosa. Fiquei mais de dez anos sem ver muitos conhecidos. Minha família não podia nem pensar em me visitar.


Você só voltou ao Brasil em 1979, com a anistia... Minha vinda foi uma epopeia. Ficamos sabendo da anistia, mas não existia consulado em Cuba. Tive que vir pelo Panamá e, chegando lá, não queriam me dar o passaporte. Fiquei semanas indo na embaixada, e eles diziam que não tinham autorização para emitir meu passaporte. Acabei vindo com uma declaração de viagem escrita em um papel. Mas consegui chegar. Aí foi aquela loucura. Imagina o chororô da família.
Foi difícil se readaptar? Quando voltei a procurar emprego, olha, vou te contar... Ia toda arrumadinha. Minha irmã comprou um vestido para mim, pintei o cabelo. Fiquei agoniada atrás de emprego. Até que me falaram que o Sérgio Motta [empresário e ministro da Comunicação de Fernando Henrique Cardoso, morto em 1998] arrumava muito emprego para quem tinha saído da cadeia. Me convidaram para ser bibliotecária. Mas eu não tinha diploma. Acabaram me registrando como auxiliar de biblioteca. Fiquei trabalhando lá. Menina, você não imagina o sucesso. Estava contentíssima, já tinha entrado no PT, na Secretaria de Mulheres.
Como foi esse seu retorno à militância pós-anistia? Quando voltei, começaram a me chamar para fazer palestras sobre Cuba. Eu estava feliz da vida. Chegava em casa, fazia minha comida. Até que um dia tocaram a campainha, e era toda a comissão de mulheres do PT. Perguntei se tinha acontecido alguma coisa e elas: “A gente quer que você seja candidata a deputada pelas mulheres”. Disse que elas estavam loucas, que isso nunca tinha passado pela minha cabeça. Mas aceitei. Resultado: tive mais de 19 mil votos [mas não foi eleita]. Não sei como. Eu não tinha dinheiro. Mas todo mundo queria ajudar. Foi uma coisa linda. Ninguém sabia como eu tinha tido tanto voto. Depois disso, fiquei superconhecida. Todo mundo me chamava para fazer palestras. Entrei na Secretaria de Mulheres, trabalhei na assessoria de relações internacionais com a [Luiza] Erundina. Trabalhei na Câmara. Ai, é tanta coisa que fiz que nem te conto. E continuo fazendo. Porque, quando você vai entrando na luta, você não para. Sou do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, desde que entrou o Lula. Sou da Secretaria de Mulheres do PT e presidente da Associação Mulheres pela Paz. E ainda dou palestras. Tem muita coisa para a gente fazer.
Em que o movimento Mulheres pela Paz atua? A gente combate a violência contra a mulher. Nosso foco agora é trazer homens para dentro do movimento. Achamos que o homem não deve ser visto como inimigo, mas como alguém que pode ajudar no combate. Eles podem ajudar os filhos a não praticar violência contra mulher, podem denunciar e ajudar se isso estiver acontecendo com alguém da sua família.
Como é a sua rotina? Ainda trabalho muito. Mas tenho meus limites desde que quebrei o fêmur, em Brasília, quando anunciaram a candidatura da Dilma, há quase três anos. Tinha muita gente conhecida lá, eu estava muito feliz, e alguém atrás de mim me chamou. Fui virar, perdi o equilíbrio e caí. Daí me botaram na ambulância, mas não tinha leito disponível em nenhum hospital de Brasília. Avisaram o Lula e eu fiquei esperando até ele conseguir um leito para mim no hospital das Forças Armadas, que a princípio só atende militares e familiares e pessoas que têm cargo oficial. Mas ele deu um jeito e fui pra lá.
A senhora precisou ser operada? Fui operada e fiquei internada até me recuperar. Nesse meio-tempo, decidiram que seria melhor eu me mudar para perto da minha irmã Sara. Então quem fez a mudança, alugou e deu um jeito neste apartamento [no Bom Retiro, região central de São Paulo] foi o pessoal do PT. Os móveis da sala, essa estante... Eu não tinha nada disso. Quando voltei pra São Paulo, já voltei pra cá. Ah! E foi num avião das Forças Armadas também, a pedido do Lula, porque ainda não podia andar. Quando eu ia imaginar que ia ser bem tratada pelas Forças Armadas?

Essa foi a entrevista dada ao Provocações, em 2011.

Há ainda uma outra entrevista dela no site do PT.


domingo, 28 de julho de 2013

Papisa Joana

Representação medieval da Papisa Joana, como João VII, gravura constante do livro Crônica de Nuremberg, de 1493 de Hartmann Schedel

Papisa Joana teria sido a única mulher a governar a Igreja durante dois ou três anos. Uns afirmam que a história é uma lenda. Mas é muito interessante saber o que se diz desta mulher que teria ocupado o posto mais alto de uma religião que sempre relegou as mulheres posições inferiores aos homens.

A história aparece pela primeira vez em documentos do início do século XIII, situando os acontecimentos em 1099. Outro cronista, também do século XIII, data o papado de Joana de até três séculos e meio antes, depois da morte do Papa Leão IV, coincidindo com uma época de crise e confusão na diocese de Roma. Joana teria ocupado o cargo durante dois ou três anos, entre o Papa Leão IV e o Papa Bento III (anos de 850 e 858).

Uma ilustração datada de 1560 (aproximadamente) da Papisa Joana com a Tiara Papal, absolvendo um monge em confissão. Do acervo da Biblioteca Nacional da França.

A história possui várias versões. Segundo alguns relatos, Joana teria sido uma jovem oriental, nascida com o possível nome de Giliberta, talvez de Constantinopla, que se fez passar por homem para escapar à proibição de estudar imposta às mulheres. Extremamente culta, possuía formação em filosofia e teologia. Ao chegar a Roma, apresentou-se como monge e surpreendeu os doutores da Igreja com sua sabedoria. Teria chegado ao papado após a morte do Papa Leão IV, com o nome de João VII. A mesma lenda conta que Joana se tornou amante de um oficial da Guarda Suíça e ficou grávida.
Trechos do livro "De Mulieribus Claris""Mulheres famosas", de 1362, escrito por Giovanni Boccaccio (1313–1375)

Outra versão - a de Martinho de Opava - afirma que Joana teria nascido na cidade de Mogúncia, na Alemanha, filha de um casal inglês aí residente à época. Na idade adulta, conheceu um monge, por quem se apaixonou. Foram ambos para a Grécia, onde passaram três anos, após o que se mudaram para Roma. Para evitar o escândalo que a relação poderia causar, Joana decidiu vestir roupas masculinas, passando assim por monge, com o nome de Johannes Angelicus, e teria então ingressado no mosteiro de São Martinho.
Conseguiu ser nomeada cardeal, ficando conhecida como João, o Inglês. Segundo as fontes, João, em virtude de sua notável inteligência, foi eleito Papa por unanimidade após a morte de Leão IV (ocorrida a 17 de julho de 855).
Apesar de ter sido fácil ocultar sua gravidez, devido às vestes folgadas dos Papas, acabou por ser acometida pelas dores do parto em meio a uma procissão numa rua estreita, entre o Coliseu de Roma e a Igreja de São Clemente, e deu à luz perante a multidão.

As versões divergem também sobre este ponto, mas todas coincidem em que a multidão reagiu com indignação, por considerar que o trono de São Pedro havia sido profanado. João/Joana teria sido amarrada num cavalo e apedrejada até à morte. Neste trajeto depois foi posta uma estátua de uma donzela com uma criança no colo com a inscrição "Parce Pater Patrum, Papissae Proditum Partum", conforme mais tarde 1375 atestado pelo "Mirabilia Urbis Romae".
Noutro relato, Joana teria morrido devido a complicações no parto, enquanto os cardeais se ajoelhavam clamando: "Milagre, milagre!".

Doc curtinho e interessante sobre a Papisa

A história foi publicada pela primeira vez no século XIII pelo escritor Estêvão de Bourbon (m. 1261), frade dominicano e historiador, reportando-se a lenda ou história espalhada pelos séculos que o precederam (porém sem provas cabais).
Em 1886, voltou a ser difundida pelo escritor grego Emmanuel Royidios no romance A Papisa Joana, traduzido para inglês em 1939 pelo escritor Lawrence Durrell.
Marianus Scoto (1028-1086), historiador alemão e monge beneditino, recluso da abadia de Mogúncia, referindo-se a ela em sua "storia sui temporis clara, segundo ele:
“o papa Leão morreu nas calendas de agosto e foi sucedido por Joana, uma mulher, que reinou durante dois anos, cinco meses e quatro dias".
Martino de Troppan, ou Martinus Polonus, padre dominicano, do século XIII, capelão papal, em Roma, em sua "Chronica Pontificoram et Imperatorum", diz que:
"Depois do papa Leão veio João Anglius, nascido em Mogúncia, que foi papa durante dois anos, sete meses e quatro dias e morreu em Roma após o que houve uma vacân¬cia no papado por um mês."
 a Papisa Joana representada como o Anticristo, montando a Besta do Apocalipse

Sigeberto de Gemblours, monge beneditino (1030-1113), em sua "Chronica", escreveu:
“Houve rumores de que esse João era uma mulher e era conhecida como tal apenas por um companheiro que teve relações com ela e a deixou grávida. Ela deu à luz quando era papa. Por isso alguns historiadores não a incluem na lista dos papas".
Otto de Frisingen (m. 1158), da realeza alemã e bispo de Frisingen, em dos seus sete livros de crônicas narra:
“Há uma interrogação a respeito de um certo papa, ou melhor, papisa, que não é incluído na lista dos papas de Roma porque era uma mulher que se disfarçava de homem. Um dia, quando montava a cavalo, deu à luz uma criança”.
Godofredo de Viterbo, secretário na corte imperial, lá pelo ano de 1185, diz o seguinte:
"Joana, a papisa, não é contada depois de Leão IV".
Jean de Mailly, dominicano francês da cidade de Metz, no ano de 1250, em seu "Chronica Universalis Mettensis", diz:
"Há uma interrogação a respeito de um certo papa, ou melhor, papisa, que não é incluído na lista dos papas de Roma porque era uma mulher que se disfarçava de homem e a motivo de seus grandes talentos tornou-se secretário curial, cardeal e papa. Um dia,quando montava a cavalo, deu à luz uma criança".
Donna Woolfolk Cross; em seu "Pope Joan", editado pela Geraçao Editorial em 496 páginas, traz uma minuciosa narrativa sobre a história, os fatos antecedente e posteriores.
Martin le Franc, (1410-1461), poeta francês, originário da Normandia, reitor em Lausanne e um secretário do papa Nicolau V (1447-1455) e do antipapa Félix V, em seu poema "Le Champion des Dames", faz referência aos paramentos litúrgicos empregados por Joana.

Dennis Barton, em seu "Pope Joan", em uma descrição narrativa e pormenorizada.
Rosemary e Darroll Pardoe; em seu "A papisa Joana" "The female Pope: Ths mistery of Pope Joan" - The First Complete Documentation of the Facts behind the Legend; editado pela Ibrasa: São Paulo: 1990. Biblioteca Histórica, etc; vol. 38; traz uma narrativa pormenorizada, com fontes épocas e ligações históricas.
Alain Boureau; "The myth of Pope Joan", editado pela "University of Chicago", em 05 de janeiro de 2001 - 385 Páginas.
Alexander Cooke, escritor protestante de Oppenheim, em seu "Johanna Papissa toti orbi manifestata", de 1616, que, em defesa à sua memória, voltou a enunciá-la nas calendários papistas, de onde ela até então era (e continua sendo) excluída.
Entretanto, à base dos fatos, o teólogo David Blondel, de Amsterdam em um escrito de 1647 (ver nota e o filósofo alemão Wilhelm Leibnitz, além de enciclopedistas franceses, rotularam a história como falsa. Além destes, seguiram-se outros, como John Thurmaier, o “Aventino” (?-1534), de Abensberg, Baviera, em seu "Annales Boiorum"; Onofre Panvínio (?-1568), de Venenza, em seus escritos datados de 1557; Florimundo de Rernond, em seu livro '"Erreur populaire de la papesse Jeanne", editado em Paris em (1558), que aponta e enuncia as contradições relativas aos fatos sobre a existência histórica do papa Joana e o douto Ignaz von Doellinger e Joan Lockwood O'Donovan, em consideração ao fato consumado de "ser uma lenda", questiona o "onde" e o "por quê" dela ter surgido.


Há um filme sobre ela, feito em 2009.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Márcia X

[o texto e as fotos desta postagem foram retiradas do site oficial da artista. Lá vcs encontraram vários vídeos exclusivos de performances]

Márcia Pinheiro de Oliveira nasceu no Rio de Janeiro, em 1959, e estudou na Escola de Artes Visuais do Parque Lage.Iniciou sua carreira em 1980, com a performance Cozinhar-te, em colaboração com o grupo Cuidado Louças, no 3º Salão Nacional de Artes Plásticas, quando conquistou o Prêmio Viagem ao País. 


Outra performance foi Chuva de Dinheiro (1983), quando Márcia Pinheiro – nome que utilizava na época - e Ana Cavalcanti lançaram enormes notas de CR$ 5 de cima de um prédio na esquina da Av. Rio Branco e Nilo Peçanha, no Rio.


Em 1986 a artista, em parceria com o poeta e artista Alex Hamburguer, realizou intervenção intitulada Triciclage – Música para duas bicicletas e pianos, quando entrou em cena em um pequeno velocípede durante apresentação de John Cage e Jocy de Oliveira, da peça Winter Music, de autoria de Cage, na Sala Cecília Meireles, no Rio.


Adotou o X. de seu nome quando realizou performance em parceria com Alex Hamburguer na Bienal do Livro, em 1985, no Rio. Vestida com duas “não roupas”, uma capa preta e uma outra transparente e sem nada por baixo Márcia Pinheiro despiu-se até ficar nua. Na época a reação da estilista homõnima dizendo dedicar-se a vestir e não despir pessoas fez com que a artista adotasse Márcia X. Pinheiro e posteriormente Márcia X.






Ainda em dupla com Alex Hamburguer Márcia X. realizou diversos trabalhos. Dentre eles destacam-se: Sex Manisse, Macambíada, Pathos, Paixões Paranormais e J.C.Contabilidade.



Em 1987 realizou uma parede com sabão em pedra intitulada Soap Opera, no 6º Salão Paulista de Arte Contemporânea, na Fundação Bienal de São Paulo. Durante o evento, em parceria com Aimberê César, realizou um vídeo de mesmo nome.






Em 1988 realizou sua primeira instalação individual, Ícones do Gênero Humano, no Centro Cultural Cândido Mendes, no Rio. Durante o vernissage, com a galeria vazia, Márcia X. e Aimberê César fotografaram e filmaram todos os presentes e, posteriormente, penduraram as fotos nas paredes.
Em 1990 realiza sua primeira instalação individual Coleção Gênios da Pintura na Galeria Casa Triângulo, São Paulo.


Durante os anos 90 Márcia X. iniciou uma de suas mais marcantes séries – Fábrica Fallus – continuou a desenvolver até 2005.







Segundo Sergio Bessa, em seu texto X-Rated (duas ou três coisas qu’eu sei dela) para a Revista Item, “Márcia X. repetidamente assume uma entidade infantil. Na instalação Arte Erõtica (MAM, 1993) e na sua individual na Galeria Sérgio Porto (1995), por exemplo, a escala dos trabalhos bem como a escolha de os instalar ao nível do chão convidava o espectador a assumir uma postura (física) que o trouxesse ao nível da criança. Para devidamente apreciar sua arte o espectador deveria regredir a um estado infantil. Esta estratégia é ambiguamente passiva e agressiva, pois transforma objetos pornográficos em brinquedos infantis, ao mesmo tempo que torna brinquedos infantis em agressivos objetos erõticos”.


Em 2002 participou, em parceria com Ricardo Ventura, com a performance Complexo de Alemão do evento Riocenacontemporânea, no Largo da Carioca, Rio.




Em 2003 a dupla realiza outra coletiva: Grande Orlândia - Artistas Abaixo da Linha Vermelha, a terceira e última da série. No mesmo ano realizou também em parceria com Ricardo Ventura a performance Poralelogramo no evento Alfândega, no Armazém 5, no Cais do Porto, Rio. No mesmo ano participou do MIP- Manifestação Internacional de Performance, organizada pelo Centro de Estudos e Informação de Arte, Belo Horizonte.

A partir de 2000 Márcia X. viu reconhecido seu trabalho por parte da crítica especializada. Inúmeros convites se seguiram e, entre os mais importantes podem ser destacadas suas participações no Panorama das Artes (São Paulo e Rio) com a performance Pankake, na Bienal do Mercosul (Porto Alegre), com a performance Ação de Graças, e na instalação Os 90 (Rio), com a instalação Reino Animal. É deste ano a performance Desenhando com Terços, realizada pela primeira vez na Casa de Petrõpolis. Nela Márcia X., de camisola branca, usou 400 terços para realizar desenhos de pênis no chão em uma sala de cerca de 20 metros quadrados.


Em 2003 e 2004 realizou duas das mais emblemáticas performances de sua carreira: Alviceleste e Cadeira Careca / Le Chaise Chouve, respectivamente. Na primeira, nas Cavalariças da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Márcia despejou tinta azul de caneta tinteiro em funis de vidro pendurados no teto. A tinta escorria por finas correntes e impregnava o chão de gesso formando manchas azuis. Na segunda, em parceria com Ricardo Ventura, barbeou uma chaise longue Le Corbusier Le Cobusier, Charlotte Perriand e Pierre Jeanneret, de couro de vaca, nos pilotis do edifício Gustavo Capanema, antiga sede do Ministério da Cultura, no centro do Rio. Nesta homenagem a Le Courbusier os artistas citaram também Le Dejeuner en Fourrure, de Meret Oppeheim, obra fundamental para o movimento surrealista.




Com uma carreira firme e independente, imune às críticas e sucessivos cortes de participação em salões e outras mostras e também à censura e ao cancelamento de diversas performances, Márcia X. foi uma artista como poucas. Sempre atenta à sua importância no meio artístico, Márcia X. seguiu em frente, lutando contra o que chamou de “enorme descrédito em relação à performance”.

Morreu em 2005.